Aplicado o filtro por Data: Setembro 2021
Vida Efêmera, Ilusões Tardias
Dia após dia
Uma taça de vinho, um solo do violino e a noite avança inquieta
É madrugada, ruas vazias inebriadas e uma pobre luz compassiva
Mal vai iluminar aos precários transeuntes em seu andar trêmulo
Olho os passantes pela janela tal qual invulgar cinema doméstico
Ouço o barulho de um resto de chuva que goteja como lamento
Sei que há tanto a observar em momentos sem grandeza heroica
Imagino-me estar preso ao longo braço d’um inescapável destino
Seria, então, esse silêncio inexpugnável, uma sólida sina cósmica
Ou será um fato corriqueiro do sorriso não ocorrer na nossa hora
Dia após dia, mais admito que essa dor obedece a leis ancestrais
Os dias amanhecem cansados e a rosa ao mar já não volta à areia
O que viria a nos aproximar transformou-se num muro entre nós
As estradas, antes luminosas e febris, estão vazias e vão ao vazio
Quero crer que esta angústia partirá a seguir as nuvens que vão
Para que se salve este vinho, pois não é hora de voltar ou morrer
COLUNA DA MARIA LUIZA 23 - TERRA UMA POÉTICA DE NÓS
MULHER TERRA UNA
Participar de um Festival de Poesias em 2021.
Participar de um Festival de Poesias em 2021 em Lisboa, onde o homenageado é MIA COUTO.
Participar deste festival foi desafiador. Sobretudo um ato de rebeldia e de coragem desta poeta.
Escrevi a poesia que está na coletânea TERRA, UMA POÉTICA DE NÓS, conversando com todas as mulheres que transitaram pela minha alma em algum momento. Uma poesia gestada, parida, cuidada, polida....
MULHER TERRA UNA, está entregue ao mundo na Coletânea onde 126 poetas lusófonos, residentes em 14 paises, aceitaram o desafio de "poetar".
Para mim é a verdadeira premiação objetiva e não subjetiva.
Compartilho a poesia!
Mulher terra una!
Acordou mulher pássaro,
mulher raiz, mulher nuvem
um mundo atemporal
enquanto asas, trocava amiúde com as nuvens
confidências de seivas raízes
enquanto raízes, colhia recados do céu
relatos de banhos de chuva,
deleites em brisas, tempestades e medos
danças estrelares,
descoberta de cometas
mulher pássaro carregava na boca sementes
a deitá-las em berços ninados pela mulher raiz
fazendo afagos diuturnos na mãe terra
mulheres acordando neste tempo
numa revolução silenciosa
avatares essenciais
matrizes de outro momento
acariciando o coração da terra
em ritmos de um só palpitar
consoantes de elementos vitais
sangrando e fertilizando
invocando total e perene irmandade
no voo daquela que acordou pássaro, nuvem, raiz
renascendo Terra una.
por Maria Luiza Kuhn 2021
O amante e a trapezista
O tremular dos olhos que antecede à lágrima denuncia
Os dias que uma fina, sutil dor nos assoma e nos rasga
Essa dor de ser nós mesmos, que não dá para disfarçar
Qual a tristeza interior da criança que, no berço chora
A dor faz sentir qual estar de braços dados com o nada
Com vestidos de noite, mas com os gestos suburbanos
Um vapor que paira no horizonte nas horas de sombra
Uma leve força hipotecada que tem o peso do universo
A forma da tristeza pode ser apenas um olhar magoado
Ou o riso desbotado de um nostálgico (trágico) mundo
A presença efêmera das palavras que ficaram sem dizer
Uma cantiga de cabaré entoada num afinado fio de voz
Ao olhar atento, àquele que interessar vai olhar e sentir
A tristeza e suas expressões têm forma diversa na alma
No silêncio dos quartos vazios, na lucidez das avenidas
Como sentir a vida esvair, gota a gota, no meio do peito
A dor de amar é igual se aventurar sem rede no trapézio
Gestos
Escada para o céu
Cavalos de Fogo
A falta que ela faz
Pétalas Escarlates
A pandemia aumentou em cerca de 15% os suicídios entre elas
A dor de ser poeta
Se existe algo de justo na vida, todo poema deve ser lido
Vagarosamente, saboreando as palavras repetidas vezes
Cada verso pede um suspiro, que se guarde um certo ar
Para o verso seguinte. Cada verso pode ser um universo
Mas pode doer como dói o mundo certos dias cinzentos
Um poema pode ser profundo ou raso, banal ou efêmero
Pode ser efusivo e transbordante, qual um abraço amigo
Podemos erguer uns muros para nos escondermos da dor
Podemos construir a nossa própria história de um paraíso
E os paraísos são tão fugazes, às vezes, tal qual um que li
O poema pode ser árido como há dias sinto dentro de mim
Correndo entre areias sem, desastrosamente, algum oásis
Como tentar uma inútil fuga, pois não se pode fugir de si
O poema pode ser um drama ou pode fazer pessoas rirem
Já nem sei qual destes amanheço para escrever e eu gosto
Sim escrever pode doer, quando fala das perdas e feridas
Mas temos que escrever, dar vida à poesia e só assim, viver